Fazenda Agrícola Famosa: Um acaso de sucesso
Por: Darlan Moreira
24/11/2012
24/11/2012
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Luiz Barcelos: de empregado em São Paulo a grande empreendedor no Ceará. A empresa também explora no Tabuleiro de Russas.
Dois paulistas receberam uma fazenda no Nordeste em troca de
uma dívida e, em poucos anos, a transformaram na campeã nacional de
exportação de frutas frescas.
Até 1994, Luiz Barcelos e Carlos Porro trabalhavam em uma
empresa de São Paulo que comprava e exportava frutas. Quando o Plano
Real surgiu e a moeda brasileira passou a valer mais que o dólar, o
negócio ficou impraticável. A trading exportadora e um fornecedor para
os quais ela adiantava recursos em troca da produção futura faliram.
Em meio à adversidade e para evitar um prejuízo maior, os dois decidiram receber em troca de uma dívida uma fazenda de produção de melão em Icapuí,
a 200 quilômetros da capital cearense (Fortaleza), na divisa dos
Estados do Ceará e Rio Grande do Norte. A região assusta quem não tem
convívio com o Semiárido nordestino. O sol é escaldante, a terra é de um
areal avermelhado, a vegetação é rala e praticamente não há fontes de
água na superfície.
Aquela terra que parecia um deserto, contudo, era a única opção
para os paulistas. “Viemos para o Ceará porque a empresa onde
trabalhávamos fechou, tínhamos pouco dinheiro para tentar outro negócio e
havia uma dívida a receber em Icapuí”, relembra Luiz Barcelos. Naquela
época, a terra era barata (R$ 150 por hectare). “Além disso, a produção
de melão era ideal para quem tinha pouco capital de giro, pois o retorno
era rápido: apenas 60 dias entre o plantio e a colheita”, justifica.
Na ocasião, eles receberam 5.100 hectares de terra, mas com
apenas 20 hectares preparados para receber plantio. Batizaram a fazenda
de Famosa. “Para nós, era tanta terra que eu dizia para o meu sócio que
não íamos conseguir explorar toda ela em vida”, comenta Barcelos. A
previsão, felizmente, não se confirmou. A propriedade evoluiu de maneira
impressionante, ficou pequena para os planos dos sócios e se
transformou num caso de sucesso.
Atualmente, a Agrícola Famosa conta com 16 unidades de
produção, distribuídas em mais de 23.000 hectares de terras próprias ou
arrendadas nos Estados do Ceará, Rio Grande do Norte e Pernambuco – além
do Senegal, na África. Em 17 anos, a terra recebida como dívida deu
origem a uma “holding” (Famosa Participações), que também inclui
empresas de produção de mudas (Top Plant), clones (Bioclone) e
comercialização de verduras e legumes (Viva). O faturamento estimado de
R$ 250 milhões para a safra 2012/2013 dá ideia do tamanho do
empreendimento. Somente com melão e melancia serão cultivados 6.200
hectares. No auge da safra – que se estende de agosto a fevereiro –,
chegam a sair mais de 300 contêineres, com média de 21 toneladas de
frutas, toda semana. “A Agrícola Famosa é considerada a maior produtora
mundial de melão”, observa Sérgio Bessa, gerente de análises e projetos
da Agência de Desenvolvimento Econômico do Ceará (Adece).
Durante a safra, quase 7 mil funcionários entram em campo. As sobras alimentam o gado
NÚMEROS QUE IMPRESSIONAM
Na época da safra, a movimentação nas áreas de produção é
gigantesca. Entram em operação 250 tratores e quase 7 mil trabalhadores.
Cento e noventa poços artesianos fornecem água (até 4 milhões de litros
disponíveis), que segue para as lavouras em 30.000 quilômetros de
mangueiras. “Um número impressionante, considerando que a circunferência
da Terra é de 40.000 quilômetros”, diz Barcelos.
Nem todo o potencial de irrigação, contudo, é usado ao mesmo
tempo. A cada semana, são plantados 240 hectares de melão – colhidos
cerca de 60 dias depois. “Plantamos em outubro um produto que vai ser
consumido perto do Natal na Europa, considerando o espaço de 15 a 20
dias para o despacho e o transporte marítimo”, comenta Paulo Dantas, com
formação em turismo, mas que, há oitos anos, deixou a capital do Rio
Grande do Norte (Natal) para trabalhar na Famosa.
As atividades do grupo, no entanto, não se resumem à produção
de melão e minimelancias (algumas até em formato quadrado). Também
cultiva 250 hectares de mamão, 150 hectares de banana, além de abacaxi,
milho doce, aspargos, beringela, quiabo, abobrinha, pepino e
tomate-cereja. Na safra passada (2011/2012), saíram das fazendas mais de
8.500 contêineres transportando 20,4 milhões de caixas de melão,
melancia, mamão e banana – volume que deve ter incremento considerável
nas próximas colheitas.
Em 2013, a área de mamão será duplicada e a de banana passará
dos atuais 150 para 350 hectares. Mas nada se compara ao crescimento
previsto para o melão, carro-chefe da Agrícola Famosa. Num espaço de dez
anos, a área plantada deve passar dos atuais 5.700 para 13.300
hectares. De acordo com a empresa, a tendência é que os pomares de
melão, melancia, mamão e banana somem 17.400 hectares até 2022.
No segmento de frutas, o grupo também aposta em outras frentes:
o cultivo de limão, laranja, pera, maçã e caqui. Além disso, a empresa
está consorciando a produção agrícola com outras iniciativas.
Atualmente, a Agrícola Famosa cria 3 mil cabeças de gado e despesca
semanalmente 5 toneladas de tilápia de 39 tanques abastecidos com a água
dos poços artesianos – alguns dos quais jorrando com temperaturas
superiores a 40 graus célsius.
A intenção é produzir já no próximo ano 30 toneladas de tilápia
por semana e reutilizar a água dos tanques (rica em nitrogênio) para
adubar capineiras para o gado e até hortaliças. “A ordem aqui é
aproveitar tudo”, comenta Matheus Farias, engenheiro aquicultor que saiu
de Santa Catarina para tocar a produção de peixes na Agrícola Famosa.
Ele também planeja introduzir o camarão-grande-da-malásia junto com a
tilápia. “São espécies que não concorrem por alimentos. Ao contrário,
elas se complementam”, explica.
APROVEITAR TUDO
A “ordem” de consorciar agricultura com outras atividades já é
uma prática. Por causa do ciclo acelerado do melão, nem todas as plantas
crescem e amadurecem de maneira uniforme. Assim, até pouco tempo, de
cada 35 toneladas produzidas por hectare, apenas 25 eram colhidas, e,
destas, só 15 toneladas tinham qualidade adequada para exportação –
outras 10 toneladas eram repassadas para atravessadores por valores
entre R$ 0,10 e R$ 0,15 por quilo.
“Observamos que o pessoal que comprava nosso produto ia
revendê-lo nos supermercados da região, e isso estava afetando o
conceito do melão de melhor qualidade, além de concorrer diretamente
conosco nas prateleiras”, conta Barcelos. A solução encontrada foi, ao
mesmo tempo, simples e inédita: comprar gado e engordá-lo com a sobra do
melão, cuja semente tem teor de proteína de 19%. Hoje, a Agrícola
Famosa alimenta com essas sobras 3 mil reses – e pretende chegar a 6 mil
cabeças.
A diversificação das atividades do grupo, no entanto, não para
por aí. Recentemente, a Agrícola Famosa fez um contrato de arrendamento
de terras com a geradora Furnas e o banco BMG para instalar 55 turbinas
de produção de energia eólica na propriedade – investimento aproximado
de R$ 500 milhões que, em plena operação, vai produzir 137,5 megawatts
ao mês e proporcionar receita mensal superior a R$ 100 mil pelos
próximos 20 anos.
Se a experiência de produção de energia se revelar positiva, o
grupo estuda investir diretamente no negócio. Atualmente quase nenhuma
possibilidade é descartada. A Agrícola Famosa está investindo, por
exemplo, na produção de melão no Senegal (África), numa área inicial de
100 hectares. A estratégia é produzir na época da entressafra do
Nordeste brasileiro (período das chuvas) e manter um fluxo contínuo de
exportação durante todo o ano para a Europa.
Ao mesmo tempo, o grupo trabalha para conquistar novos mercados
para seus produtos. Recentemente, abriu canais de negociação com
Emirados Árabes, Cingapura, Chile, China e Malásia, além de iniciar
entendimentos para reduzir uma sobretaxa que os Estados Unidos impõem ao
melão brasileiro. Outra possibilidade é a abertura do capital da
empresa, que já está despertando o interesse de fundos financeiros
nacionais e estrangeiros.
“Crescemos muito rapidamente e, de uns quatro anos para cá,
sentimos a necessidade de profissionalizar mais nossa gestão.
Contratamos consultorias e hoje temos uma empresa bem estruturada”,
pondera Barcelos, que junto com Carlos Porro detém 79% da empresa (em
partes iguais). Em 2009, os outros 21% da Agrícola Famosa foram
repassados para três engenheiros agrônomos – Richard Muller, Marconi
Clímaco e Lavoisier Oliveira –, cada um com 7% de participação.
Fonte: TV RUSSAS/CE
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